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Coronavírus ameaça a existência da Galeria do Rock

Combate Rock

21/03/2020 07h00

Marcelo Moreira

Entrada da Galeria do Rock (FOTO: DIVULGAÇÃO/WIKIPEDIA)

Como era esperado, várias medidas extremas foram tomadas pelos governos estadual e municipal em vários locais do país para conter a disseminação do covid 19-coronavírus. O isolamento social está institucionalizado, radicalizando de tal forma que poderá, de muitas formas, inviabilizar a vida normal das pessoas e a economia, como um todo.

É necessário que isso ocorra? Sim, infelizmente. Fechamento de parques, shoppings e todo o tipo de comércio, além do cancelamento de shows e eventos que reúnam aglomerações precisam ser proibidos até que as autoridades sanitárias considerem seguro o retorno à normalidade.

Com as previsões de novo, e mais grave, período de recessão, já se espera uma onda de quebradeira de pequenos comércios e serviços que não terão como ficar sem faturamento por pelo menos três meses, assim como profissionais autônomos e pessoas que trabalham na informalidade.s

Dentro desse sinistro cenário está um dos cartões postais de São Paulo e pontos turísticos importante. Em comunicado ao público, a Galeria do Rock, seguindo as orientações dos governos, anunciou que vai interromper as atividades por tempo indeterminado para colaborar com o combate ao coronavírus.

O problema é que o comunicado, um tanto alarmista, mas pertinente, embute um recado tenebroso: a real possibilidade de que muitas lojas do local não voltem a funcionar por impossibilidade econômica de ficar sem vender por muito tempo.

Atualmente são 215 estabelecimentos comerciais no conjunto originalmente chamado Grandes Galerias, na avenida São João, 439, no centro de São Paulo.

Com a crise do mercado fonográfico e a música ficando grátis, hoje restam pouco mais de 10% das lojas dedicadas as, DVDs e produtos ligados ao rock – já foram quase 50% nos bons tempos.

Hoje o predomínio é de estabelecimentos que vendem roupas, tênis e bugigangas variadas. Todos são pequenas empresárias que têm margens estritas de lucro e parco capital de giro.

"Provavelmente as 215 empresas que atuam hoje na Galeria do Rock e geram mais de 1.200 empregos diretos talvez não consigam sobreviver a esse período. Afinal, fechamos hoje sem saber ao certo quando vamos abrir novamente", diz o comunicado. 

O Combate Rock conversou com alguns dos lojistas da Galeria do Rock por telefone e por WhatsApp, a maioria comerciantes de música. O clima é de velório e o pessimismo domina, embora quase todos evitem falar em fechamento definitivo do negócio.

Apenas um deles – todos pediram para não ser identificados -,falou abertamente que as chances de encerrar o negócio são muito grandes.

"Já faz muito tempo que a situação está ruim, os hábitos de consumo de música mudaram demais e as vendas caíram bastante. Estava difícil segurar e, com esse fechamento forçado, sem faturar nada, fica totalmente inviável", disse o mais pessimista de todos.

Outro demonstrou resignação e desolação, mas ainda faz alguma aposta em vendas online, por mais que ainda existam indefinições a respeito funcionamento dos Correios.

Um outro ainda conseguia ter dois funcionários, mas terá de dispensá-los em, no máximo, dois meses. "Sem vendas, sem fluxo de caixa, pouquíssimas reservas. O negócio pra e fica inviabilizado. É cedo para falar em fechar definitivamente, evito pensar nisso, e não tenho como descartar essa hipótese."

A Galeria do Rock, com as perspectivas sombrias, talvez seja a face mais explícita do agravamento da crise no meio musical em São Paulo, onde músicos estão preocupadíssimos com o desaparecimento das chances de se apresentar pelos próximos três meses.

Não há uma luz no médio prazo. Ao mesmo tempo em que as medidas extremas são necessárias e contam com apoio maciço da população, é difícil imaginar como vai ficar a vida financeiras das pessoas com o estancamento quase por completo do cotidiano das pessoas.

Muitas medidas econômicas paliativas estão sendo aplicadas pelos governos, mas são insuficientes para à maioria das empresas e dos trabalhadores – o que dirá então em relação a uma parcela do mercado, o do entretenimento, que está longe de ser a prioridade.

Por mais extremo e desastroso que seja o pensamento, infelizmente a possibilidade de uma transformação radical da Galeria do Rock após essa grave crise sanitária que se esparramou para a economia é real. Inclui, inclusive, o fim da instituição como a conhecemos. A extinção de lojas de discos do local é uma ameaça muito séria que, se confirmada, causará uma perda gigantesca para o mundo da música e para a cidade de São Paulo.

Leia o comunicado da administração da Galeria do Rock:

A Galeria do Rock, ciente da sua importância CULTURAL na cidade de São Paulo e no Brasil, fecha suas portas.
Na luta pelo bem comum e a fim de combater o avanço e a proliferação do CORONA VIRUS, a Galeria do Rock e todos os seus lojistas decidiram pelo fechamento de nossas portas por tempo indeterminado, a partir do dia 20 de março 2020.

Ficamos felizes em poder contribuir para o esforço coletivo e mundial no combate ao COVID 19, pois evitando aglomerações e tomando os cuidados básicos de higiene, estamos todos salvando vidas. Queremos compartilhar um sentimento com cada um de vocês que escrevem junto conosco, a cada dia, a nossa história e nos ajudam, visitando, comprando ou até mesmo contando histórias sobre a Galeria do Rock.

A opção pelo fechamento tem uma consequência: a de que provavelmente as 215 empresas que atuam hoje na Galeria do Rock e geram mais de 1.200 empregos diretos talvez não consigam sobreviver a esse período, afinal, fechamos hoje sem saber ao certo quando vamos abrir novamente. Vocês nos conhecem, conhecem cada lojista, sabem que somos todos micro e pequenos empresários e nosso "ganha-pão" é a venda do dia a dia, não temos grandes reservas e o acesso a um crédito justo é impossível. Temos por aqui uma luta diária, por anos e anos, prefeitos após prefeitos e o Centro de SP é cada vez mais abandonado. A prefeitura se nega a cumprir sua obrigação básica que é dar assistência às pessoas, aos moradores, aos trabalhadores e fazer a zeladoria atendendo a quem mais precisa, seus cidadãos. Vocês que frequentam o centro sabem do que estamos falando. São lutas diárias para manter nossos negócios contra a incompetência de prefeitos e prefeitos regionais que mentem e ignoram a necessidade de quem precisa. A Galeria do Rock é o único prédio da cidade de São Paulo com mais de 50 anos que tem AVCB, AVS e certificado de acessibilidade e mesmo estando em um entorno com edifícios literalmente caindo, sofremos diariamente a pressão de autuações sem sentido algum.

A Galeria do Rock tem um papel cultural fundamental na cidade de São Paulo, no Brasil e na vida de cada um de vocês. Por isso contamos com o apoio e incentivo de todos, pois queremos e vamos passar por mais essa, e cada lojista vai precisar da ajuda de vocês assim que abrirmos novamente. Palavras de carinho e apoio aos lojistas vão nos ajudar, e muito. Por enquanto fiquem em casa, preservem-se.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
Contato: contato@combaterock.com.br

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