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Grineberg: filosofia, espiritualidade e muito blues

Combate Rock

18/07/2019 06h56

Marcelo Moreira

Em uma noite chuvosa de inverno de 2013, quando o Tom Jazz era na avenida Angélica, na zona oeste de São Paulo, um homem de seus 50 anos de idade, trajado com um elegante terno, assistia embasbacado ao lançamento do CD "Blues For Africa", em uma eletrizante apresentação do pianista paulistano Adriano Grineberg. Fechou os olhos quando a cantora Graça Cunha cantou uma canção em iorubá, um idioma africano. "É puro misticismo", exclamou ao final da música.

O que ele considerou misticismo nada mais era do que a forma musical da filosofia de vida de um dos artistas mais interessantes do underground brasileiro. Afinal, nada mais underground atualmente do que o blues brasileiro.

Grineberg é um dos seus principais representantes. Pianista e tecladista requisitado e extremamente criativo, fez de "Blues For Africa" o seu cartão de visitas e ganhou elogios efusivos no Brasil e no exterior.

Quase seis anos depois, o músico retorna à música autoral com "108 – Names of God" aprofundando suas conexões com a filosofia e a espiritualidade. E vem também com uma mudança: agora ele se apresenta apenas usando o sobrenome, assim como fez lá nos anos 70 o vocalista Ian Gillan (Deep Purple em carreira solo).

O álbum está disponível nas principais plataformas digitais e é a base de seu novo show, que será apresentado no dia 27 de julho (sábado) às 21h no Teatro do Sesc Belenzinho (SP).

Grineberg é um artista conectado ao mundo e usa as suas múltiplas conexões artísticas para ampliar as suas possibilidades sonoras em seu novo álbum.

Se em "Blues For África" ele foi audacioso ao incorporar o universo do continente africano em belas canções cantadas em iorubá, entre outros idiomas, agora o pianista expande as possibilidades criativas.

"108" é a síntese de uma história de quase 30 anos de carreira. Além do blues, linguagem na qual é um dos maiores conhecedores nos instrumentos de teclas da América do Sul, sempre manteve seu olhar nas ligações com as raízes africanas, mas também sempre atento ao regionalismo da riquíssima cultura brasileira.

É o caso da música regional do Maranhão e também de lugares improváveis de se estabelecer essa relação como Índia, Paquistão e Oriente Médio – todos locais que Grineberg visitou entre 1995 e 2015 em longas permanências.

Grineberg em nova fase (FOTO: DIVULGAÇÃO)

As músicas foram compostas nas mais diversas línguas ancestrais dessas localidades como "hindi" (Índia), "sânscrito" (India), qawalli (Paquistão), persa antigo, árabe e também o iorubá, na releitura de alguns pontos do candomblé assim como.

Não bastasse tudo isso, Grineberg incorpora elementos da presença da influência "sufi" da África Ocidental (Mali, Níger e Mauritânia) e dos tuaregues (nômades do deserto do Saara) – tudo isso é considerado o DNA dos primórdios da forma rítmica, melédica e poética do blues, que atravessou o oceano Atlântico rumo à América do Norte.

O nome do álbum é inspirado no número 108, considerado sagrado em algumas tradições do oriente como na Índia e em outras partes da Ásia e representa a manifestação plena da divindade suprema manifestada no universo nas mais diversas formas de expressão, o que sintetiza a diversidade e multiplicidade de linguagens sonoras e ancestrais contidas na obra.

"Esse álbum é a representação de uma série de experiências pessoas que vivi ao longo de uma carreira abençoada que eu tenho. O blues representa uma música de raiz, de tradição, e considero que é um um gênero que recebe bem muito do que podemos chamar de música folk e e world music", diz Grineberg.

Como a palavra conexão é importante dentro da vida e da carreira do instrumentista, ela permeia a obra em sua totalidade. "Ahura Mazda", que abre o CD, é um blues lento e pesado, com elementos de música eletrônica e guitarras bem presentes na condução da melodia. É um mantra moderno, com infinitas possibilidades de interpretação.

"Shakti" segue na mesma pegada, só que mais transcendental. É uma canção que parece saída diretamente de um estúdio musical de Calcutá ou Nova Délhi, na Índia, em recriação impressionante, nos detalhes, da música oriental.

Grineberg retorna à África com "Oxum Xire", que poderia perfeitamente estar em "Blues for Africa". Doce, delicada e contagiante, tem um ritmo que empurra automaticamente o ouvinte para as savanas ou rituais tribais da África negra.

"Ek Bar" muda de direção e aponta para a música árabe, em um arranjo simples, mas impressionante pela veracidade com que Grineberg recria o ambiente do Oriente Médio e do norte da África.

"Hara Mahadeva" dá uma chacoalhada no ambiente ao flertar com a música oriental mais moderna e com o rock regional – não dá pra não lembrar da música feita pelas músicas das bandas Orphaned Land, de Israel, Myrath, da Tunísia, e Heretic, do Brasil. Teclados e guitarras duelam de forma sublime em um ambiente de rock progressivo.

Em uma obra espiritualizada e com conceito bem definido, era meio que esperado que pudéssemos encontrar psicodelia com ares de new age, e isso achamos em "Xango Hara", um tema que recupera influências das religiões afro-brasileiras, e em "Allah Hoo", aqui de volta à cultura árabe, mas com uma guitarra muito esperta e blueseira de André Christóvam.

Com produção de Fabá Jimenez (que já trabalhou com Filipe Catto e Ana Cañas) e arranjos do próprio pianista, "108" é o fim de um ciclo – u o começo de uma nov fase. "O novo trabalho sintetiza todas as minhas vivências musicais e espirituais desde 1995, ano de minha primeira viagem para a Índia, onde busquei todas as formas de conhecimento."

Mas e a conexão do blues com as vários influências de world music e new age? Ele responde rápido: "O blues sempre será uma expressão muito forte na música que faço, mas com o tempo e amadurecimento de alguns conceitos se tornou inevitável a influencia dos sons e paisagens sonoras adquiridas ao logo dos anos em minhas viagens não só pela India como também por países da África e o nordeste do Brasil. Trazemos também algumas referências de progressivo dos anos 70, psicodelismo e até mesmo da música eletrônica contemporânea pela forma como os arranjos estão elaborados."

No material de divculgação, Grineberg dá uma rápida explicação para cada uma das músicas:

1) Ahura Mazda: Significa literalmente (Fogo Sagrado). Matra do Zoroastrismo cantado em persa antigo que ativa a força dos elementais (fogo, água, terra e ar) que são citados na letra).
2) Shakti: Significa energia feminina complementar canta o mais diversos nomes da chamada "Mãe Divina"; Durga, Sarasvati, Parvathi, Sita (hinduísmo), Yemanjá e Obá (candomblé), Tara (Budismo), Maria (Cristianismo).
2) Xangô Hara : Ponto ancestral de candomblé (Keti) para Xangô (Fogo, Tempestade) e Airá (Vento).
3) Oxum Xirê: Roda de Fogueira para Mãe Oxum (No Candomblé representada pelas águas doces na Natureza).
4) Ek Bar: (Canta na língua hindi) Música devotada ao mestre espiritual Sri Sathya Sai Baba, do qual Grineberg é devoto. Fala da chama interior que reside em casa ser e que é despertada através do contato com o Guru. 
5) Hara Mahadeva: Música para Shiva (no hinduísmo, o Deus da Destruição) aquele que destrói no fogo para reconstruir, que mata para fazer renascer. Transforma os mundos, galáxias através de sua dança cósmica.
6) Xangô Hara : Ponto ancestral de candomblé (Keti) para Xangô (Fogo, Tempestade) e Airá (Vento).
7) Allah Hoo: Canto Sufi significa (Deus É…) Em seu aspecto cósmico e Absoluto. É o próprio corpo do Deus Uno e Universal vivo. Fala da revelação dos anjos á Mohammed e a forma como a Verdade Universal lhe foi revelada em forma de poesia na língua qawali (Paquistão).

Serviço:

GRINEBERG

Lançamento do álbum 108
Dia 27 de julho de 2019. Sábado, 21h
Local: 
Teatro (364 lugares)

Ingressos: R$ 20,00 (inteira); 10,00 (aposentado, pessoa com mais de 60 anos, pessoa com deficiência, estudante e servidor da escola pública com comprovante) e R$ 6,00 (credencial plena do Sesc – trabalhador do comércio de bens, serviços e turismo credenciado no Sesc e dependentes. Ingressos disponíveis pelo portal Sesc SP (www.sescsp.org.br) a partir de 16 de julho, às 12h e nas bilheterias das unidades do Sesc a partir de 17 de julho, às 17h30. Limite de 2 ingressos por pessoa. 
Recomendação etária: 12 anos
Duração: 90 minutos

Sesc Belenzinho
Endereço: Rua Padre Adelino, 1000.

Belenzinho – São Paulo (SP)
Telefone: (11) 2076-9700
www.sescsp.org.br/belenzinho


Estacionamento
De terça a sábado, das 9h às 22h. Domingos e feriados, das 9h às 20h.

Valores: Credenciados plenos do Sesc: R$ 5,50 a primeira hora e R$ 2,00 por hora adicional. Não credenciados no Sesc: R$ 12,00 a primeira hora e R$ 3,00 por hora adicional.

Para espetáculos pagos, após as 17h: R$ 7,50 (Credencial Plena do Sesc – trabalhador no comércio de bens, serviços e turismo). R$ 15,00 (público geral).

Transporte Público

Metro Belém (550m) | Estação Tatuapé (1400m)

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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