O avanço da censura e o comodismo nosso de todo o sempre
Marcelo Moreira
Não dá para considerarmos normal e casual o episódio de censura a uum festival de rock em Belém, ainda mais quando as motivações políticas foram explícitas.
Desde o ano passado, na campanha eleitoral, o Combate Rock e muitos outros órgãos de imprensa alertam para a escalada fascista e autoritária que o país estava vivendo, principalmente quando se desenhou a vitória do candidato extremoista de direita, Jair Bolsonaro (PSL), que foi eleito.
A constante disseminação de ódio e estímulo à violência, de seus partidários, com ataques e campanhas de intimidação contra oposicionistas, artistas e jornalistas mostravam de forma inequívoca o viés totalitário desses grupos e desse espectro político.
Consumado o resultado da eleição, a escalada de ultrajes perpetrados por grupos extremistas de apoio ao governo eleito assustou muita gente, que considerou alarmante a continuidade e virulência dos ataques e campanhas de depredação de reputações e de instituições. Nem mesmo ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) escaparam das gangues virtuais.
Empossado o governo, em janeiro passado, os ataques cresceram e as "promessas" de medidas contra os inimigos começaram a se materializar. Houve perseguições a servidores públicos concursados em todo o governo federal, e principalmente nas universidades públicas.
Eventos bancados por empresas públicas federais foram cancelados ou tiveram seus patrocícios extintos de uma hora para outra, enquanto a educação em âmbito nacional sofria cortes financeiros de modo a inviabiliar muitas atividades.
As gangues virtuais passaram a perseguir artistas e ativistas, estimulando a censura oficial a eventos de pessoas consideradas "inimigas" do governo.
E tal comportamento se espalhou para Estados e municípios, ou seja, os portões do inferno foram abertos e a malta extremista de direita se sentiu estimulada a reproduzir em outras as esferas o que estava acontecendo na União.
Era só uma questão de tempo para que toda a cadeia produtiva ligada às artes, à cultura e à educação se tornasse alvo dos inimigos da liberdade de expressão e de opinião.
Primeiro veio a intimidação a promotores de shows e de espetáculos diversos, ocasionando assim cancelamentos de eventos contratatos e "boicotes" a artistas.
Não foram poucos os roqueiros (para ficar somente no nosso espectro) que reclamaram de mudança de comportamento de empresários do setor, que estariam evitando contratar certos "artistas" por conta de questões "políticas". Se isso ocorre no underground roqueiro, imagine então em relação a músicos e artistas consagrados que se expuseram desde sempre…
De forma pontual, mas persistente, vieram em seguida as intimidações e impedimentos de espetáculos em locais públicos, como ocorreu duas vezes na avenida Paulista, em São Paulo, que fecha aos carros aos domingos.
Minutos antes de começarem a tocar, as bandas Children of the Beast (tributo ao Iron Maiden) e Heaven and Hell – Tributo a Dio foram proibidas de fazer seus shows na avenida por policiais militares e fiscais da prefeitura.
Simplesmente avisaram que tudo estava cancelado, sem maiores explicações, que foram dadas, de forma pouco clara, dias depois, e só porque a imprensa pediu informações. Uma das bandas chegou a ser mukltada em R$ 17,7 mil por supostamente ter infringido a lei, sendo que iss tampouco ficou claro.
Meses depois foi a vez da banda de hardcore Escombro ser levada à delegacia em Brasília por supostamente "ofender" policiais militares na letra de uma música autoral.
Um dos "ofendidos" estaria na plateia e teria tentado interromper o show. Não conseguiu, mas chamou "reforço" policial para ameaçar e intimidar os músicos – de forma ilegal e coercitiva, conduziu o vocalista à delegacia para "prestar esclarecimentos".
Não é coincidência que essa série de atentados à liberdade de expressão e opinião esteja acontecendo com mais intensidade a partir de agora. É um padrão de comportamento e procedimento que está se disseminando rápido pelo país com o estímulo de governantes conservadores e avessos à liberdade civil, gente medrosa que tem ojeriza a divergências e críticas.
Também não é coincidência que os ataques à liberdade de expressão e imprensa ocorram em um momento (mais um) de extrema fragilidade de um governo federal inoperante e incompetente, que não administra e se preocupa mais em produzir factoides.
Para quem achava que o rock estaria imune à censura e às intimidações – principalmente porque o número de roqueiros conservadores que votaram em Bolsonaro é muito maior do que imaginávamos – os sinais são muito claros.
O rock é sim alvo do conservadorismo de viés fascista muito mais do que outros gêneros musicais. Por enquanto a censura vai atacar os eventos mais explicitamente radicais e de protesto, comos shows e festivais punks e hardcore.
Com o precedente aberto e apoiado por seres das trevas, haverá o avanço para todo o rock e outras manifestações culturais e artísticas.
E o mais assustador é que existem poucas pessoas se manifestando e protestando contra isso. Paera muita gente de Belém e de outras localidades do país, o que aconteceu com o Facada Fest III não foi "nada demais".
Para essa gente indiferente ou autoritária, a liberdade de expressão é algo que não deve ser valorizada e que deve ser combatida. Pra essa gente, democracia parece ser apenas um detalhe.
Continuaremos quietos assistindo esses ataques aos direitos fundamentais? Ou será necessário que os evangélicos conseervadores da pior espécie consigam barrar a vinda do Slayer neste segundo semestre para que haja alguma comoção?
Sobre os Autores
Sobre o Blog
Contato: contato@combaterock.com.br
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.