Baterista original do Who, Doug Sandom morre aos 89 anos
Marcelo Moreira
A lenda é saborosa, por mais que, de vez em quando, muitos a contestem – como já foi o caso dos companheiros de banda do baterista em questão.
Eis que uma banda barulhenta de rock toca em uma festa na periferia de Londres. Eram todos muitos novos, mas o baterista destoava. Já era quase um "idoso".
Da plateia surge, ao final do show, um baixinho folgado e grita para odos ouvirem, mas se dirigindo ao vocalista. "A banda de vocês é boa, mas eu toco muito melhor do que o baterista de vocês."
O vocalista ri, mas o guitarrista fica bravo e desafia o moleque folgado a tocar e mostrar que era melhor. Ao final do "ritual" de espancamento e destruição de bateria, Keith John Moon, de 17 anos, foi contratado imediatamente. Doug Sandom, de 33 anos, acabava de perder o emprego.
E foi assim, segundo muita gente, que a banda The Who tomou a sua forma definitiva, em 1964, para se tornar uma das mais importantes de todos os tempos.
Sandom perdeu o emprego, mas consta nunca se culpou por isso ou ficou amargurado. A bateria era ma paixão, mas sempre foi muito cético em relação às possibilidades de profissionalizar. Todos, até mesmo seus ex-companheiros de banda, concordaram com ele.
O ex-baterista do Who morreu nesta semana, aos 89 anos de idade. A informação foi divulgada nas redes oficiais da banda e também no site oficial.
Doug Sandom foi parar na banda The Detours por acaso. Entre 1962 e 1963, antes da explosão da beatlemania e do rock inglês, bateristas ainda eram artigos de luxo – e os bons, mais raros ainda, geralmente muito requisitados por bandas de blues e jazz.
No desespero para manter as residências em clubes de rock e rhythm &blues que pipocavam em Londres e nos arredores, os Detours apelaram para quem estava disponível, e de preferência para quem tinha o seu próprio instrumento. O pacato e "malinha" Sandom era o que havia disponível.
Músico limitado, mas comprometido, fez o que pôde para acompanhar a energia quase punk de Roger Daltrey (vocal), Pete Tpwnshend (guitarra) e John Entwistle (baixo). Não demorou para que as diferenças começarem a ficar evidentes.
Aficionado do jazz, Sandom tinha dificuldade de manter o tempo na velocidade que a banda tocava. Não gostava do repertório e ainda sofria para cumprir horários de ensaios e shows, já rinha mulher e filhos, além de um emprego normal, digamos assim. A mulher odiava rock e a banda e fazia de tudo para impedi-lo de tocar.
No livro do jornalista Chris Charlesworth sobre o Who, está a versão mais aceita sobre a troca na bateria, versão corroborada, de leve, na autobiografia de Pete Townshend.
The Who fez vários testes em gravadoras em 1964 e houve algumas reprovações, entre elas na Fontana Records. O produtor do selo, Chris Parmeinter, disse que não gostou da forma como Sandom tocou bateria. Foi o que Townshend e o então empresário, Helmut Gordon, precisavam para tirar o baterista, com a concordância relutante de Daltrey e Entwistle.
Townshend reconhece em seu livro que não foi muito "legal" com Sandom. Este, por sua vez, contou mais de uma vez em entrevistas nos nos 80 que não se dava bem Townshend e que a elevada diferença de idade e estágios de vida contribuíram para sua saída. "Fiquei magoado, eu gostava de tocar com eles, mas não tinha ilusões, devo reconhecer. Em algum momento a separação ocorreria."
Leia mais sobre a repercussão da morte de Doug Sandom e as palavras de Townshend clicando aqui, no site Tenho Mais Discos do que Amigos.
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