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Programa Combate Rock - 1968

Maurício Gaia

05/07/2018 06h53

O bichoe estava pegando em Praga, em 1968

O ano de 1968 foi extremamente agitado no mundo todo. Da Primavera de Praga, na antiga Tchecoslováquia, às manifestações estudantis em Paris, passando pelos assassinatos de Martin Luther King e Robert Kennedy, nos Estados Unidos, e pela instituição do famigerado AI-5, no Brasil, aquele foi um ano em que seus desdobramentos trazem efeitos até os dias atuais.

Na música não foi diferente – a psicodelia entrou firme na cultura pop e muitos álbuns foram produzidos e são influentes até hoje – o programa Combate Rock faz um pequeno recorte daquele momento, trazendo alguns dos mais significativos albuns lançados há cinquenta anos.

Terra Brasillis

Começando pelo Brasil, temos a passagem da Jovem Guarda para o Tropicalismo. O movimento capitaneado por Roberto, Erasmo e Wanderleia, ainda tinha seu programa de televisão na Record – foi seu último ano, mas Roberto já vinha dando sinais de que sua carreira estava mudando. O álbum lançado naquele ano, "O Inimitável" já trazia mais influência do soul e do funk americano, além de ecos tropicalistas.

Por outro lado, o Tropicalismo lança também em 1968 seu álbum-manifesto; "Tropicália ou Panis Et Circensis", reunindo Gil, Caetano, Os Mutantes, Gal Costa, Nara Leão, Rogério Duprat e Tom Zé, é a base musical para um movimento que transpassou por outras expressões artísticas, como poesia, artes visuais e cinema. Um movimento ambicioso e antropofágico que ajustou o Brasil ao mundo contemporâneo, do ponto de vista artístico.

Ainda trazemos o álbum de 1968 de Ronnie Von, que era apresentado como "príncipe" da Jovem Guarda (o "rei" era Roberto). Ronnie Von, muito mais que um rostinho bonito da televisão, tinha acesso a muito lançamentos no exterior, que chegavam para o público em geral com meses de atraso. Essa informação privilegiada fez com que ele se influenciasse pela onda psicodélica que atingia o Reino Unido e o levou a gravar os hoje icônicos "discos psicodélicos", que acabaram sendo revisitados anos depois. Mais do que "Sílvia 20 Horas Domingo", a música que abre o álbum "Meu Novo Cantar" representa sua carta de intenções no momento.

Finalmente, os Mutantes (curiosamente, batizada assim pelo próprio Ronnie Von) também lançaram seu primeiro álbum em 1968. Com quatro, cinco álbuns (considerando os que ainda contavam com a presença da Rita Lee), os garotos marcaram seus nomes na história da música brasileira.

Mundo afora

Em 1968, os Beatles lançaram o álbum "The Beatles", que ficou conhecido como o "álbum branco". Sem nenhuma foto ou ilustração, totalmente em branco, com "The Beatles" escrito em relevo, o álbum duplo é reflexo do estágio da banda naquele momento: os conflitos internos, que acabaram resultando em sua dissolução, estão presentes ali. Com as composições divididas entre Lennon, McCartney e Harrison, cada um trabalhou como se os demais membros fossem músicos de estúdio. Ringo Starr, cansado da rotina de gravação, abandonou o estúdio e Paul McCartney acabou assumindo as baquetas em músicas como "Back in The U.S.S.R." e "Dear Prudence".

Os Rolling Stones, depois de sua tentativa fracassada em reproduzir "Sgt. Pepper's" em "Their Satanic Majesties Request" (1967) tratou de focar no que tinha de melhor para oferecer: rock'n'roll sujo calcado no blues americano. Foi assim que surgiu "Beggar's Banquet", pavimentando o caminho para seus sucessores "Let it Bleed" (1969), "Sticky Fingers" (1971) e "Exile on Main St." (1972).

Enquanto isso acontecia, o Pink Floyd lançava o seu segundo álbum, "A Saucerful of Secrets", que retrata uma dramática mudança – a demissão de Syd Barrett,  com Roger Waters assumindo a direção musical da banda, como consequência. Parte da gravação de "A Saucerful of Secrets" ainda contou com a participação de Barrett, apesar de seus cada vez mais evidentes problemas, decorrentes de sua condição mental, associadas ao abuso de drogas.

Drogas, aliás, foram temas recorrentes em "White Light/White Heat", também segundo álbum do Velvet Undeground. Depois do fracasso de vendas do álbum de estreia, lançado no ano anterior (aquele da banana), Lou Reed e John Cale decidiram afastar-se de Andy Warhol e demitiram a modelo-barra-vocalista Nico. O álbum traz uma banda mais acelerada, barulhenta e experimental, com temas que vão desde o uso de anfetaminas (na faixa título), perversões sexuais e lobotomia.

Quem assistiu ao filme "Johnny & June" (2005), sobre parte da vida de Johnny Cash e June Carter, lembra da cena do show do cantor em um presídio. Pois bem, aquele show resultou em um dos melhores álbuns ao vivo da história. Johnny, um cara que sabia muito bem como que era a barra pesada da vida, estava ali cercado de presidiários que, cada um a seu modo, tinham suas cruzes a carregar. Suas canções, cantadas com energia, tratavam com crueza e naturalidade a história de assassinos e cheiradores de pó e casavam perfeitamente com a vida daqueles homens encarcerados. "Live at Folsom Prison" pode não ser um álbum de rock, mas traz seu espírito em forma mais nua.

Depois de ter estourado na Inglaterra, em 1967, com dois grandes álbuns, "Are You Experienced?" e "Axis: Bold As Love", Jimi Hendrix conquistou a América, com uma apresentação monstruosa no festival de Monterrey. Com este cacife, ele entrou novamente em estúdio, dessa vez, em Nova York, para gravar "Electric Ladyland". Seria o álbum que consolidava o conceito da Jimi Hendrix Experience, com Noel Redding no baixo (em muitas gravações, era o próprio Hendrix no instrumento) e Mitch Mitchell na bateria. Além disso, muitas participações especiais, como de Steve Winwood, do Traffic, e Jack Casady, do Jefferson Airplane. No álbum, fusões de rock com soul, psicodelia e pitadas jazzy fizeram com que a guitarra de Hendrix encontrasse o ambiente ideal para que ela pudesse, mais uma vez, expandir os limites conhecidos para o instrumento.

1968 ainda foi o ano que marcou o lançamento do terceiro álbum do primeiro "supergrupo" da história, o Cream, formado por Jack Bruce, Eric Clapton e Ginger Baker. "Wheels of Fire" é um álbum duplo, com o último lado trazendo uma apresentação em Filmore East.

Dentro da seara do blues britânico, também trazemos "Truth", poderoso lançamento do Jeff Beck Group, onde o gênio tampinha trazia na formação de seu grupo um até então desconhecido Rod Stewart e um guitarrista que estava quebrando o galho no baixo, Ron Wood.

Para encerrar o programa, falamos daquela banda que poderia ter sido a maior banda de todos os tempos, mas que graças ao temperamento briguento dos líderes, os irmãos Ray e Dave Davies, isso nunca aconteceu. The Kinks lançou "The Kinks Are The Village Green Preservation Society", uma coleção de canções que retratavam um estilo de vida que estava em mudança na Inglaterra. Ray Davies, um ácido e perspicaz cronista da vida urbana, engendrou um album conceitual, trazendo um retrato, ora irônico, ora melancólico, da sociedade britânica.

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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