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Visionária, Escola de Rock antecipou polêmicas da Escola Sem Partido

Combate Rock

29/03/2018 12h41

Marcelo Moreira

Jack Black como o professor Dewey Finn: usando o rock para subverter a escola e "ameaçar" a comunidade (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Escola sem rock, escola sem partido. Há 15 anos uma comédia americana legalzinha – e que se tornou uma milionária franquia mundial de escola de música – antecipava a tormenta conservadora que está se abatendo sobre o nosso infeliz país.

O filme "Escola de Rock" ("School of Rock"), com toda a sua patetice e humor de pastelão, toca em um ponto que na época era caro aos americanos e que provoca polêmica no Brasil atual: devem os professores terem limites no que ensinam e no que opinam em sala de aula?

Assim como o personagem de Jack Black subverte uma classe de uma escola rica e conservadora do interior para transformar a molecada de 10 e 12 anos em sua "banda" de apoio, o abominável movimento Escola Sem Partido avança sem freios para castrar e censurar o conteúdo que é ministrado nas escolas públicas – para depois avançar com gosto nas escolas privadas.

Por definição, o tal movimento é estapafúrdio, baseado em ideias absurdas e motivações abjetas. É uma tentativa de limitar e estreitar os horizontes educacionais ao amarrar os professores na aula, transformando-os em meros empurradores de conteúdo acrítico, sem histórico, sem questionamento.

Essa ofensiva conservadora e chucra, desprovida de inteligência mas profundamente lesiva aos interesses de todos, atende a uma suposta demanda de pais amedrontados com o que consideram "excessiva ideologização da sala de aula", seja em questões políticas, seja em questões sexuais e comportamentais.

Em resumo, é um violento atentado à liberdade de expressão e opinião, sem falar que o próprio conceito de escola sem partido embute uma ideia política clara de direita, numa tentativa de banir discussões que abordem temas historicamente associados à esquerda e aos movimento de luta pelos direitos humanos e de igualdade de raça e gênero.

A revista Época, em sua edução número 1.027, de 5 de março, traz ótima reportagem sobre o tema, falando com o inominável criador do Escola Sem Partido (o advogado Miguel Nagib) e com o parlamentar que deu início a essa cruzada há mais de 10 anos – coincidentemente, o deputado estadual do Rio de Janeiro Flávio Bolsonaro (PSC), filho do deputado federal Jair Bolsonaro, do mesmo partido, candidato a presidente em 2018.

A resistência a essa excrescência é grande, tanto que a Câmara dos Deputados tem derrubado e engavetado vários projetos esdrúxulos sobre o tema, assim como o Ministério da Educação do conservador e frágil governo Michel Temer se posicionou vigorosamente contrário a qualquer tentativa relacionada à Escola Sem Partido.

No entanto, um levantamento da Universidade Federal do Rio de Janeiro contou, até janeiro, 90 projetos de restrição e controle de conteúdo de professores tramitando pelo Brasil, seja em assembleias legislativas ou câmaras de vereadores, e em cidades dos mais variados tamanhos. Destes, 28 foram aprovados e sancionados.

As bobagens da tal Escola Sem Partido são rechaçadas por especialistas de todo o espectro político – até os educadores conservadores acham essa questão uma enorme aberração.

À revista Época, Claudia Costin, professora da Fundação Getúlio Vargas e ex-secretária de Educação da cidade do Rio de Janeiro, acredita que é muita espuma para pouca polêmica. "São exceções os casos de professores que extrapolam as suas funções. E doutrinação sempre houve em qualquer escola. O que é doutrinação? Se eu ensinar evolucionismo, que é a teoria científica estabelecida e comprovada, vou estar doutrinando?"

IMAGEM: SITE MARXISMO21

Na mesma linha segue a diretora executiva do movimento Todos Por Educação, Priscila Cruz. "Não faz sentido a alegação de que as salas de aula estão dominadas por educadores que fazem "imposições políticas". "São casos muito isolados. E façamos um exercício de lógica: se realmente os professores estivessem fazendo doutrinação ideológica de esquerda, não teríamos a onda conservadora atual."

A próxima batalha sobre essa polêmica deve ocorrer em São Paulo, onde está para ser analisado em várias comissões da Câmara Municipal o projeto do movimento Escola Sem Partido, de autoria do inacreditável vereador Fernando Holiday (DEM), que integra o famigerado MBL (Movimento Brasil Livre).

Os professores municipais, junto com o restante dos servidores públicos, obtiveram uma importante vitória nesta semana ao obrigar o prefeito João Doria (PSDB) a adiar por 120 dias a votação do projeto que previa alterações na previdência municipal.

Que a mobilização contra esse projeto não esmoreça e seja tão forte e veemente para protestar e impedir que a excrescência da censura aos professores seja sequer apreciada na Câmara de Vereadores de São Paulo. As manifestações dos professores municipais será fundamental para enterrar tal iniciativa.

Se esse lixo chamado Escola Sem Partido fosse efetivamente aplicado na escola do rock, a música "subversiva" e "contestadora" certamente seria banida, assim como muitos livros, muitos jornais, muita apostilas e muitas outras coisas. Literalmente, seria uma escola sem rock.

Assim como os roteiristas do desenho animado "Os Simpsons", Jack Black e os roteiristas de "Escola do Rock" foram visionários e "enxergaram" um futuro tenebroso para a educação brasileira.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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