Público entorpecido: manifestações políticas passam batido no Rock in Rio
Marcelo Moreira
Um governo acuado e cercado, com rejeição recorde, prontinho para ser extirpado. Se dependermos da classe política e vários setores da esquerda, Michel Temer não aguenta mais cinco minutos na Presidência.
No entanto, as ruas continuam caladas, assim como o Rock in Rio 2017. Uma índia discursando no show de Alicia Keys, Samuel Rosa do Skank desabafando, e mais nada. Nem mesmo um "Fora, Temer" aqui ou ali.
Em 2013, após o auge das passeatas de junho e julho, Dinho Ouro Preto, do Capital Inicial, ousou ensaiar um discurso contra as então "mazelas políticas".
Com viés esquerdista, sua fala foi confusa, mas mostrou que o palco carioca tinha espaço para manifestações, ainda que pontuais, contra uma série de retrocessos e golpes que começavam a nascer.
Outro artista influente, Tico Santa Cruz, também usou o palco do Rock in Rio para criticar as políticas desestruturantes do governo estadual do Rio de Janeiro e a falta de políticas públicas em vários aspectos.
Embora seu discurso fosse articulado e consistente, mostrando-se coerente com sua atuação de esquerda, escorregou ao defender mascarados que se infiltravam em manifestações e bateu forte na determinação que proibia cobrir o rosto em qualquer manifestação.
A "leseira" e o comodismo que dominam a atual sociedade são reflexo direto da falta de foco, de informação, de engajamento e de inteligência. Ou seria um silêncio da vergonha pelo fato de que o "golpe" deu errado?
Não se tem notícia de que Samuel Rosa e o seu Skank sejam engajados de esquerda e militantes políticos assíduos. Entretanto, seu desabafo contra os corruptos foi contundente: "Vocês matam pessoas!". Pena que não reverberou.
Os jornais impressos e seus portais destacaram a atitude do músico mineiro, mas poucos se dignaram debater o assunto.
Na plateia, na Cidade do Rock, os brados de Rosa foram recebidos com indiferença, assim como a índia Sonia Guajajara, que se emocionou ao falar dos direitos dos indígenas e de causas ambientais.
Quando o destaque "político" do Rock in Rio foi o discurso da modelo Gisele Bündchen, que discorreu sobre a ameaça ao meio ambiente no mundo todo, é sinal de que há bastante coisa errada em um mundo onde a liberdade de expressão é atacada todos os dias e a Justiça estapafúrdia acolhe um pleito estapafúrdio autorizando psicólogos estapafúrdios a aplicar a "cura gay".
O festival apenas começou, mas o torpor que domina o público que escuta bovinamente e não reage a manifestações pertinentes sobre as trevas que caem sobre o país ameaça se disseminar nos próximos dias de espetáculo.
O desabafo de Rosa foi genérico e forte, mas menos contundente do que o momento exige. Quem se habilita a incendiar o palco com porradas diretas e certeiras contra os corruptos e os golpistas?
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