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Os deuses do rock estão morrendo - e levando junto os fabricantes de guitarra

Combate Rock

02/07/2017 06h03

Danilo Vivan* – publicado originalmente na rede social LinkedIn

Eric Clapton (FOTO: DIVULGAÇÃO)

"The slow dead of the eletric guitar" – "A morte lenta (e, sim, muito dolorosa) da guitarra elétrica" é o título de reportagem publicada na semana passada pelo The Washington Post, um dos principais jornais dos Estados Unidos. O Post relata que, na última década, as vendas de guitarras caíram de cerca de 1,5 milhão de unidades para 1 milhão de unidades.

Em apenas três anos, as vendas da Gibson, marca usada por monstros do rock como Slash (do Guns´n Roses, com sua Les Paul) e Angus Young (AC/DC, com a clássica SG), caíram de US$ 2,1 bilhões para US$ 1,7 bilhão em três anos. Já as vendas da Fender (a preferida, por exemplo, de Eric Clapton e de Richie Blackmore, ex-Deep Purple, ambos amantes do modelo Stratocaster), diminuíram de US$ 675 milhões para US$ 545 milhões.

Diante desse cenário, a Gibson, vejam só, teve sua classificação de crédito rebaixada pela agência Moody's – a mesma que frequenta o noticiário financeiro quando se trata do risco soberano dos países. Pode soar estranho juntar, num mesmo parágrafo, o mundo rebelde do rock'n roll e o universo sisudo do noticiário financeiro, mas, como em qualquer outro mercado, as dívidas dos fabricantes de guitarras passam por esse tipo de análise e o diagnóstico, como se percebe, não é dos melhores. A Guitar Center, maior rede de varejo de instrumentos dos Estados Unidos já tem sua dívida classificada pela Moody's num patamar próximo do dos junk bonds (papéis especulativos).

Como afirma a matéria, negócios emergem e afundam o tempo todo. Faz parte do jogo. O que conta, neste caso, é o porquê da agonia do universo guitarrístico, um segmento que habita o imaginário de tanta gente. Se até há duas décadas, quase todo adolescente queria ser Slash, Eddie Van Halen ou Satriani, hoje, diante da falta de ídolos desse quilate, os fabricantes lutam na mesma arena de companhias como a Apple para conquistar o coração de Ys e millenials – observa o Post.

A geração dos Baby Boomers, que ajudou a criar o mito do guitar heroe, com gênios como Clapton, Jimmy Hendrix e Page (do Led Zeppelin), está saindo de cena. Clapton, que já foi comparado a Deus em pichações em muros de Londres, está com 72 anos e sofre de uma doença no sistema nervoso que, cada vez mais, o impede de tocar seus divinos acordes. Em abril, foi fotografado no aeroporto de Los Angeles numa cadeira de rodas, pouco antes de cancelar alguns shows sob a alegação de uma crise de bronquite. Keith Richards (dos Rolling Stones), mesmo com todos os memes a respeito de sua imortalidade à prova de drogas, logo terá 80 anos. E David Guilmour, do Pink Floyd (meu preferido), tem 71.

Heróis mais recentes, como Slash, Eddie Van Halen, Richie Sambora (Bon Jovi) e Satriani já passaram dos 50. Seguem na ativa, mas que já não têm o mesmo poder de renovação do público. "Nossos consumidores estão ficando velhos", resume, na matéria do Post, o CEO da rede americana de lojas Sam Ash, Richard Ash.

A salvação seriam caras novas, como John Mayer. Mayer é um excelente músico (reconhecido, inclusive, por Clapton), possui hits bacanas e faz sucesso com o público feminino – atributo que boa parte dos adolescentes busca. Mas não empolga tanto quanto os guitar heroes de antigamente. Não a ponto de fazer legiões de moleques irem às lojas para comprar guitarras, ávidos para conseguir o mesmo sucesso.

Num mundo sem MTV, em que a música se dispersa por canais como o Youtube, Deezer e Spotify e com as paradas cada vez mais concentradas nas mãos de poucos artistas (entre 1986, 19 grupos atingiram o topo das paradas nos Estados Unidos; de 2008 a 2012, quase todos os sucessos eram de seis artistas, como Rihanna e Lady Gaga), o mercado das guitarras parece atirar para todos os lados em busca de uma saída. A Gibson, por exemplo, adquiriu, em 2014, a Woox, divisão de áudio da Philips, passando a produzir, além de guitarras, headphones e equipamentos para home theater, por exemplo. "Somos uma empresa de música (não só de guitarras)", afirma o CEO da empresa, Henry Juszkiewics. Já a Fender tem investido pesadamente em plataformas de ensino de guitarra, como a Fender University.

Dentro de algumas décadas, saberemos se esse esforço deu resultado ou não. O que, no entanto, parece cada vez mais claro, é que, para as novas gerações, ser um guitar hero e deixou de ser um sonho de consumo.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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