Thiago Bianchi e Mario Linhares: unidos pela dor, pela esperança e pela perseverança
Marcelo Moreira
Só a música salva. Muita gente usa esse "slogan" para repudiar sons ruins e gêneros mais populares e supostamente com menos qualidade – ou mesmo para escapar daquele momento ruim do dia quando alguém ou algo perturba.
A música salva vidas, salva mentes e resgata a esperança. Foi e sempre será assim na história de dois grandes cantores de rock do Brasil que voltaram das trevas e transformaram a dor em arte antes mesmo que o mestre David Bowie o fizesse em "Blackstar", em 2015, às vésperas da morte.
Thiago Bianchi, vocalista do Noturnall, e Mario Linhares, cantor e líder do Dark Avenger, conseguiram ultrapassar obstáculos poderosos e fazer de suas carreiras uma ode diária à vida e à vontade de viver.
É difícil falar em "exemplos" – não gosto deste termo por conta da carga enorme de presunção e certa arrogância. No entanto, as trajetórias dos dois músicos merecem mais do que simples atenção.
Seus trabalhos misturam uma miríade variada de emoções e informações, dialogando de forma pungente com um público interessando não somente no peso da música ou nas rimas às vezes simples de suas canções.
Bianchi esteve novamente no inferno no ano passado e, como na velha lenda do pássaro fênix, que renasce das cinzas escapou da morte para impregnar o próximo trabalho, o terceiro CD do Noturnall, com experiências angustiantes e impressionantes.
"Eu tive uma pancreatite que quase me matou em 2016, fiquei quase dois meses internado. O caso foi tão grave que começou a afetar outros órgãos. Foi uma luta grande e decisiva", disse o cantor em entrevista exclusiva ao programa de web rádio Combate Rock, que irá ao ar em breve.
Bebendo álcool além da conta, com excesso de peso e ignorando os sinais do corpo, Bianchi parecia indestrutível, ainda mais depois de superar no comecinho dos anos 2000 um câncer agressivo que por pouco não o levou à morte.
"Pode ser que inconscientemente eu estivesse em uma vibe de pouca preocupação com a saúde, mas é óbvio que nunca me considerei indestrutível, por mais que estivesse ignorando uma sequência de excessos", analisa Bianchi.
O cantor não dá pistas, mas as recentes experiências deverão fazer parte das letras do próximo CD do Noturnall, que terá novidades e um direcionamento musical mais heavy e um pouco mais clássico – a volta do guitarrista Léo Mancini é uma indicação deste caminho.
"Não dá para ignorar o que passei, e isso vai refletir no trabalho de alguma maneira, ainda sei como. Mas, de alguma maneira, a valorização da vida aparecerá", acredita Bianchi, que celebra a vida e a recuperação com o lançamento de um projeto bastante interessante, "Thiago Bianchi's Arena", um CD lançado no começo do ano.
Recheado de participações especiais de craques do rock nacional, acabou se tornando uma compilação de canções gravadas ao longo de muitos anos e terá toda a renda das vendas revertida para instituições que atendem crianças com câncer.
A experiência com a dor é mais antiga e também mais presente na vida de Mario Linhares, da banda brasiliense Dark Avenger. Convivendo ainda hoje com dificuldades para andar e vitimado por uma doença grave nos anos 2000, o cantor transformou os problemas de saúde em algo grandioso e eloquente nos trabalhos de sua banda, resgatada do limbo há pouco mais de cinco anos.
Reconhecidamente como um dos mais brilhantes compositores do rock pesado brasileiro – para este Combate Rock, é o melhor – Linhares transformou pequenas peças existencialistas em mini-óperas. Suas letras em inglês extrapolam as histórias e ganham dimensões diferentes quando suas experiências pessoais são confrontadas com os temas que aborda.
Como Bianchi, Linhares celebra a vida e o fato de estar vivo, mas é menos efusivo, explosivo e muito mais reflexivo. Curioso e intelectualmente inquieto, precisa com urgência de explicações.
Ele abusa da erudição e das referências literárias, no bom sentido das expressões, e comete obras de cunho filosófico de fôlegos e surpreendentes dentro da música feita no Brasil, como o excelente CD "Tales of Avalon: Lament", do Dark Avenger.
"The Beloved Bones: Hell", o próximo CD do Dark Avenger, que deverá ser lançado em agosto, será fruto de suas incômodas inquietações, mas sobretudo também é resultado de uma expiação da dor e das dificuldades.
Linhares não explode em rompantes de energia criativa – ele a condensa, processa e a transforma em temas complexos existenciais, produzindo obras de rara beleza e intensidade dentro do heavy metal atual, seja no Brasil ou no exterior.
Unidos pela perseverança, os dois artistas celebram a vida e produzem algumas das músicas mais interessantes e de qualidade do rock brasileiro atual.
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