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Quinze anos sem Cássia Eller

Combate Rock

02/01/2017 15h45

Ricardo Gozzi – do site Roque Reverso

Cássia Eller (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Cássia Eller (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Se o roquenrow brasileiro sobreviveu à virada do milênio, quando era atacado em todas as frentes de mercado pelas implacáveis hordas do axé, do funk e do sertanejo universitário, o estilo deve muito a Cássia Eller, falecida precocemente há 15 anos, vítima de uma parada cardíaca.

Excepcional cantora, instrumentista habilidosa, musicalmente eclética e arranjadora versátil, Cássia Eller precisou de pouquíssimo tempo para consolidar-se como uma das maiores intérpretes da história da música brasileira.

Apenas 11 anos separaram o lançamento do primeiro disco, o roqueiro "Cássia Eller", da morte da cantora. Em tese, já vivemos mais tempo sem ela do que com ela. Mas foram 11 anos inesquecíveis e dignos de memória, por mais redundante que isso possa parecer.

Simultâneo à criação da MTV, o primeiro LP emplacou uma versão linda da balada "Por Enquanto", da Legião Urbana, na esteira de um videoclipe básico de voz e violão. E enquanto a baladinha de Renato Russo impulsionava as vendas, quem ouvia o disco impressionava-se com a voz e com os arranjos de um repertório que abraçava a Vanguarda Paulistana, relia ícones do rock nacional e trazia uma ousada versão reaggae para "Eleanor Rigby", dos Beatles.

Na sequência veio "O Marginal". Trata-se de um dos melhores discos de rock já produzido por algum artista brasileiro. Guitarras pesadas misturaram riffs complexos e cheios de groove à interpretação vocal impecável de Cássia, enquanto as letras seguiram pelo caminho da irreverência. Duas faixas ("Eles" e "O Marginal") levam a assinatura de Cássia como coautora, ambas excelentes, mas é como intérprete que ela se destaca, como de costume. Se você nunca ouviu, pare para escutar as versões de Cássia Eller para "Caso Você Queira Saber" (Marcio Borges/Beto Guedes), "Sensações" (Luiz Melodia), "Teu Bem" (Arrigo Barnabé), "Aquele Grandão" (Leda Pasta/Mario Manga), "Hear My Train a Coming" (Jimi Hendrix) e "If Six Was Nine" (Jimi Hendrix).

"O Marginal" teve apenas um problema: vendeu menos da metade que o primeiro "Cássia Eller". O resultado comercial ruim colocou sob pressão a manutenção do contrato de Cássia Eller com a PolyGram, que expiraria com o lançamento do disco seguinte. Assim como o primeiro LP, o terceiro também levou o nome "Cássia Eller" e foi gravado depois do nascimento de seu único filho. As guitarras pesadas seguem presentes, mas o ecletismo de Cássia Eller fica mais exposto do que nos dois primeiros trabalhos em meio a interpretações memoráveis.

O disco abre com uma versão para "Partners", do RPM. E isso poderia até ser interpretado como autoironia, uma vez que a música original integrou "Quatro Coiotes", o excelente álbum experimental que resultou em fiasco comercial e precipitou o fim daquele que foi o maior fenômeno musical brasileiro dos anos 1980.

Na sequência, Cássia Eller brinda o ouvinte com a primeira gravação já feita para "Malandragem", de Cazuza e Frejat. Foi este o carro-chefe perfeito para Cássia Eller fazer as pazes com o sucesso.

"E.C.T.", parceria de Nando Reis, Marisa Monte e Carlinhos Brown, também chama a atenção na primeira parte do disco. Mas as melhores faixas ficaram para o hoje extinto lado B, que contém "Lanterna dos Afogados" (Herbert Vianna), "Coroné Antonio Bento" (Luiz Wanderley/João do Vale), "Metrô Linha 743" (Raul Seixas), "Socorro" (Arnaldo Antunes/Alice Ruiz), "Blues do Iniciante" (Barão Vermelho), "Música Urbana 2" (Renato Russo) e "Pétala" (Djavan).

Dali em diante, nada mais parecia ser capaz de frear o sucesso de Cássia Eller. Entre um e outro disco ao vivo, registros impecáveis da energia de Cássia Eller e sua banda em cima do palco, o tributo a Cazuza em "Veneno Antimonotonia" (1997) provou-se sucesso de público e crítica. Veio então "Com Você… Meu Mundo Ficaria Completo" (1999), produzido por Nando Reis e portador do megahit "O Segundo Sol".

O céu era o limite. A carreira de Cássia Eller estava no auge em 2001, quando se apresentou no Rock In Rio 3 e lançou o "Acústico MTV". Ela tinha apenas 39 anos quando um enfarte do miocárdio a levou em 29 de dezembro de 2001. Como não poderia deixar de ser, o preconceito e a misoginia logo levantaram a hipótese depois desmentida de overdose.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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