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O (pouco) admirável e perigoso mundo novo do rock nacional

Combate Rock

02/01/2017 06h46

Marcelo Moreira*

Dentro da música pop do século XXI, o rock foi a maior vítima de um fenômeno que é consequência direta das mudanças drásticas do mercado musiscal e do entretenimento: a desvalorização progressiva da arte até o ponto de se tornar gratuita e, portanto, descartável. A música perdeu valor agregado porque ficou gratuita, muito fácil de ser obtida. Na disputa por atenção de outras formas de entretenimento, ficou em segundo plano.

O terremoto que tal mudança tecnológica e comportamental provocou no mundo do entretenimento ainda não foi totalmente absorvido, nem no Brasil, nem no exterior.

O que restou do antigo modelo de negócio, como gravadoras e selos musicais, ainda se agarra a gêneros populares, de alta penetração nas emissoras de rádio e que ainda fatura muito com shows constantes e aparições frequentes na TV. Não é por outro motivo que, em agosto de 2016, das 50 músicas mais tocadas nas emissoras de rádio, 41 eram de artistas sertanejos, e apenas uma do que antes se chamava pop rock.

Lamentavelmente, esse estado de coisas, com a predominância da pior parte de um único gênero musical, só contribui para a depreciação cada vez maior da música com bem cultural.

A massificação de produtos musicais, em vez de ser amenizada com a destruição do mercado, piorou por conta da voracidade dos sobreviventes da indústria – incapazes de buscar novas soluções mercadológicas, pretendem sugar até a última gota de um cenário depredado e sem futuro, ao menos por enquanto.

Por que o rock foi, talvez, a maior vítima da mudança de comportamento do apreciador de música? Um dos trunfos do gênero é a forma de como o fã se relacionava com os artistas.

Gigantes como Led Zeppelin, Rolling Stones, Metallica, Iron Maiden, Bob Dylan e outros sempre terão um público enorme, mas bandas médias de classic rock, como Uriah Heep, Jethro Tull, Motley Crue e mesmo as mais recentes de metal mantniveram por muito tempo um público cativo que deram suporte a elas por muito tempo.

A relação do fã com a música mudou no século XXI. Ele perdeu o interesse em se aprofundar e conhecer aquilo que está ouvindo. Despende pouco tempo para uma música nova, um álbum novo, um artista novo.

As facilidades de se obter música e a profusão de opções aos milhares são fatores que impulsionaram a pulverização da atenção. Se o acesso à música e a artistas novos ficou mais fácil, por outro lado dificulta, e muito, a expansão e a estabilização de nomes novos em qualquer cena que exista, ou surja.

O fã de rock, em geral – assim como o de jazz décadas atrás -, era diferenciado porque tinha uma relação mais intensa com artistas. Costumava consumir com mais frequência não só a música, mas outros produtos associados, como revistas, livros, e não só de um artista apenas.

Costumava ser mais fiel ao gênero que que os fã de outros gêneros musicais e fazia questão de colecionar LPs e CDs, de manter atualizada a discografia de mais de um artista. O cenário mudou no exterior e também no Brasil.

Como a concorrência é maior por uma fatia muito menor de "mercado", digamos assim, quem tem algum suporte sai na frente, como no caso dos artistas sertanejos e do funk.

Até o antes onipresente pagode está no ostracismo. E aí chegamos a uma outra questão: até que ponto o rock no Brasil foi realmente popular? Até que ponto o público que consumiu rock especialmente depois dos anos 90 realmente gostava de rock?

Há analistas e críticos que afirmam que o rock, no Brasil, voltou a ter o tamanho que sempre teve e que deveria ter, seja por nçao ser um gênero musical nativo, seja por ter sido vítima de uma bolha artificial que se tornou o mercado fonográfico brasileiro nos anos 90.

O boom do rock nacional, que teria durado entre 1984 e 1996, não passou de um sonho inflado por excessos de uma indústria musical e de entretenimento que não se envergonhava de sugar até a última gota do bagaço da laranja.

Quando o mercado ruiu e a preferência do que sobrou do mercado recaiu sobre atrações sem qualidade e de apelo imediato, o rock nacional e parcela do investimento em produtos de artistas estrangeiros foram descartadas.

Desde então, o público diminuiu, tanto no consumo como em shows, as cenas se pulverizaram e tiveram de se reinventar. As bandas têm dificuldades adicionais e maiores para chamar a atenção do público.

Pior: grande parte dos artistas do rock nacional e do metal (que cantam em inglês) têm dificuldades ainda maiores para encontrar e definir qual é o seu público. Gastam dinheiro, mesmo que de forma tosca, em gravações de músicas e de clipes que são disponibilizados de graça na internet, se frustram com o retorno inferior ao esperado. As perspectivas não são boas nos próximos anos.

* Texto originalmente produzido para a revista paranaense Sintonize.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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