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Black Sabbath sob todos os ângulos, em três livros ótimos em português

Combate Rock

10/03/2015 06h49

Marcelo Moreira

Os fãs brasileiros do Black Sabbath podem se considerar agraciados com o que há de melhor escrito sobre a banda em português com o lançamento recente do livro do escritor e jornalista canadense Martin Popoff. "Black Sabbath" ganhou um subtítulo desnecessário na edição brasileira da edutora Dark Side – "Destruição Desencadeada" – e traz um panorama completo da carreira do quarteto criador do heavy metal.

E o livro de Popoff tem esse diferencial em relação a "Black Sabbath", do inglês Mick Wall, e de "Sabbath Bloody Sabbath", de Joel McIver, ambos também editados no Brasil nos últimos dois anos. O autor canadense avisa no prefácio que, em virtude da farta literatura a respeito da banda, preferiu se concentrar apenas na música, analisando todos os álbuns, oferecendo detalhes de gravações, das composições e dando alguma pitada nos bastidores de separações ou contratações/demissões de músicos.

A edição brasileira tem um necessário posfácio, já que o livro original foi lançado em 2006 e não foi atualizado pelo autor. Os dois capítulos adicionais foram aprovados por Popoff, que inclusive dá uma entrevista interessante aos tradutores da obra, comentando principalmente o álbum "13", lançado em 2013.

Com material de primeira e reeditando o capricho da edição original norte-americana, o livro da editora Dark Side traz um relato minucioso da parte musical do Black Sabbath. Não descreve como foram gravados os álbuns, mas também consegue fazer uma análise rápida a respeito da qualidade de cada obra e sobre as características principais de todas as músicas já editadas pela banda,

Quem quiser mais detalhes sobre a vida cotidiana dos integrantes, é melhor buscar as outras duas obras. Martin Popoff praticamente ignora a infância dos quatro músicos originais e se detém apenas o suficiente para contar como começou a carreira musical de Tony Iommi. Ele parte logo para descrever como os integrantes se conheceram e como se juntaram para formar o Polka Turk Blues Band, depois Polka Turk, depois Earth, até finalmente decidir por se tornar Black Sabbath em 9 de agosto de 1969.

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Talvez seja um pouco frustrante ter quase nenhum detalhe do acidente que Iommi sofreu em seu último dia em uma metalúrgica, quando teve decepadas as pontas de dois dedos da mão esquerda. Também há apenas a menção à prisão de Ozzy Osbourne por roubo aos 18 anos. São eventos que tiveram impacto fundamental na vida dos dois e na formação do Sabbath.

A parte musical, entretanto, compensa, e muito, as lacunas das vidas pessoas dos integrantes. As descrições técnicas e opiniões sobre as obras são acompanhadas por muitas entrevistas, dos quatro integrantes originais e de músicos periféricos e roadies, além de assistentes pessoais. O vocalista Tony Martin foi uma fonte valiosíssima, assim como Ronnie James Dio, Cozy Powell, Vinnie Appice, Glenn Hughes e Ian Gillan.

Sem entrar no mérito das questões pessoais/contratuais, Popoff descreve com detalhes os relacionamentos entre os músicos e o modo como ocorriam as "trocas". Sem usar adjetivos, apenas descrevendo em detalhes a postura de cada um, bem como o comportamento em várias situações, é possível concluir: ética e respeito muitas vezes foram ignoradas principalmente por Tony Iommi.

Foram vergonhosas as disputas mesquinhas entre Iommi e o baixista Geezer Butler e o vocalista Ronnie James Dio, três homens maduros, mas emocionalmente problemáticos e com egos inflados. Pior ainda foram as "demissões" de Tony Martin (duas vezes), Cozy Powell (duas vezes) e de outros músicos. Normalmente, ficavam sabendo que estavam fora da banda pela imprensa, quando os boatos – e depois as confirmações – de "voltas" das formações clássicas surgiam.

Só que, muito, mas muito pior, foi o comportamento reprovável em relação ao baterista Bill Ward, nas várias voltas que a banda realizou. Sempre desprezado e excluído algumas vezes, como na última, quando do álbum "13", Ward foi desrespeitado de forma absurda pelos "amigos" de banda e, especialmente, pela empresária Sharon Osbourne, mulher de Ozzy.

A obra de Popoff é muito importante para quem quiser mergulhar nas questões artísticas e musicais especificamente, embora a tradução tenha aspectos complicados, como vários descuidos em alguns trechos e erros de português acima do normal.

"Black Sabbath – A Biografia", de Mick Wall (Globo Livros), é um livro mais abrangente, e se preocupa em fazer uma análise crítica e contextualizada de toda a carreira da banda. Está mais próxima de uma biografia do que o livro de Popoff. De um rigor técnico e narrativo impecável, Wall nunca deixa de mostrar admiração pela banda, mas nem por isso alivia nas críticas pesadas a alguns álbuns e na forma como o grupo conduzia a sua carreira.

O inglês faz uma boa descrição da vida dos quatro integrantes originais antes do Black Sabbath, acrescenta vários detalhes biográficos interessantes e dá um destaque demasiado a Tony Iommi, descrevendo minuciosamente o desenvolvimento de sua carreira, com direito a boas informações sobre o acidente na fábrica e a maneira como conduziu a sua entrada e saída no Jethro Tull. Também dá atenção especial à vida pessoal de seus integrantes, mostrando como o caos cotidiano dos quatro e as complicações em casa atrapalhavam, e muito a vida da banda nos anos 80.

Aplicando técnicas do que outra se convencionou chamar de jornalismo interpretativo, Wall descreve o Black Sabbath como uma banda improvável, com quatro jecas do interior saindo do nada e desbravando a carreira aos trancos e barrancos – e afirma que o Sabbath é mais improvável ainda por ter inventado o heavy metal. Cruel e frio, ele afirma sem dó: ""Eles eram o lixo e sabiam disso. Intrusos musicais que seriam sempre lembrados disso, revelado pelo que sabiam que eram: os mais baixos dos baixos."

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Para o escritor, a carreira da banda, aleatória e largada em vários sentidos, era reflexo direto do que considerou uma quase que total falta de preparo para encarar o show business, mesmo depois de lançar cinco ou seis discos. A falta de controle era uma tônica na vida deles – não controlavam a carreira, os lançamentos, as capas, o gerenciamento de turnês e muito menos as vidas pessoais.

Tudo isso teve impacto violento sobre todos os aspectos negativos que envolviam o Sabbath. é uma obra densa e intensa, às vezes amarga e desconfortável, mas compõe um painel diferente e rico – e bem mais complexo – de uma banda icônica e idolatrada.

"Sabbath Bloody Sabbath" (Madras Editora), de  outro jornalista inglês, Joel McIver, tem a finalidade de ser realmente uma biografia, tanto na sua estrutura narrativa como no privilégio dos fatos históricos. Ele não se furta a analisar a obra musical ou avaliar o impacto de determinadas decisões/comportamentos sobre a carreira, mas a descrição e a explicação dos eventos têm a prioridade.

Mais condescendente do que Wall, McIver reconhece mais méritos na ascensão do Sabbath e atribui muitas qualidades musicais aos quatro integrantes originais que Wall ou deixa de lado ou desconsidera como importantes – ou, ainda, não tão determinantes para construir o mito Black Sabbath.

"Sabbath Bloody Sabbath" é o mais indicado para quem procura conhecer a biografia da banda. Dá para dizer que é um meio termo entre as três obras. "Black Sabbath – Destruição Desencadeada", de Martin Popoff, é mais indicado para quem quer mergulhar na vida puramente musical. "Black Sabbath – A Biografia", de Mick Wall, apresenta um perfil biográfico crítico, analítico e contextualizado dentro do rock e do heavy metal, bem como detalhes sobre a condução da carreira, bastidores e vida pessoal dos quatro músicos da formação original. É um passo adiante em relação aos concorrentes.

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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