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Centro cultural e palco: os factoides de sempre na Galeria do Rock

Combate Rock

03/03/2015 07h00

Marcelo Moreira

Aquele monumento cultural que um dia foi chamado de Galeria do Rock está afundando lentamente na irrelevância e se transformando em mero shopping center de quinquilharias. De vez em quando, aparece na mídia em algum factoide destinado a promover o seu vaidoso chefão, o síndico Antonio Souza Neto, especialista em criar espuma e o maior incentivador das mudanças pelas quais o local passou nos últimos 15 anos.

A piada da vez agora é a "nova" tentativa de transformar aquele que já foi um dos principais centros turísticos e de compras da cidade – uma concentração única no mundo de comércio de música – em um "centro cultural", mantra que ele repete incansavelmente, sem resultados concretos, há pelo menos cinco anos.

Souza voltou à carga neste ano e emplacou mais factoides na boa revista Veja São Paulo na semana passada, quando mais uma vez divulgou o projeto de centro cultural. Para ressaltar a sua ação, afirmou que foi a Brasília, em busca de recursos para montar um museu (de novo?) e criar um palco para festivais de rock (de novo?).

O texto da Veja São Paulo sobre os mais recentes factoides de Antonio Souza Neto pode ser lido clicando aqui.

Os supostos planos do síndico se tornaram a única defesa que ele tem para rebater as críticas dos lojistas mais tradicionais e dos puristas a respeito das mudanças drásticas que ele promoveu em sua administração. A mudança de perfil comercial, incentivada por Souza, alterou também o perfil dos frequentadores e espantou um público de maior poder aquisitivo que consumia música e produtos ligados a ela, segundo alguns empresários que ainda resistem no local.

Com base nos argumentos de "modernização" e "reposicionamento" do centro comercial, Souza incentivou cada vez mais a instalação de lojas de roupas, acessórios, estúdios de tatuagem e de toda uma série de bugigangas, em uma diversificação desastrada de mix de produtos, ainda que boa parte deles esteja ligada, de uma forma ou outra, ao rock. As lojas de música, no entanto, estão desaparecendo em ritmo acelerado.

"As lojas de música e instrumentos musicais estão saindo e dando lugar a um varejinho de quinquilharias. A Galeria do Rock hoje é uma 25 de março no pior sentido do termo. Privilegiou-se produtos de baixo custo e populares, de qualidade ruim, e depreciou-se os produtos importantes com valor agregado e cultural. Essa opção comercial desvalorizou a galeria como um todo e a descaracterizou, afastando o consumidor que comprava. Não tenho medo de dizer: hoje a galeria tem muito mais gente, mas é gente que compra muito menos ou quase nada", constata resignado um veterano empresário do local que pediu para não ser identificado.

A crise de identidade, que se instalou no local ao mesmo tempo em que o perfil comercial e de público ia mudando, desembocou em uma disputa pouco salutar em torno do destino da galeria como polo cultural de moda, tendências musicais e mesmo de revelação de novos talentos. Criou-se uma guerra entre o síndico, apoiado por novos comerciantes, ligados ao comércio de roupas, acessórios irrelevantes e bonequinhos variados, entre outras quinquilharias, e os chamados "dinossauros", tratados com certo desprezo pelo síndico como "empresários sem visão comercial amarrados a um passado bem distante".

Entrada da Galeria do Rock (FOTO: DIVULGAÇÃO/WIKIPEDIA)

Entrada da Galeria do Rock (FOTO: DIVULGAÇÃO/WIKIPEDIA)

 

O Combate Rock retratou em diversas reportagens no Estadão.com e no extinto Jornal da Tarde, desde 2009,  as disputas entre Souza e seus adversários a respeito do futuro da Galeria do Rock. E desde aquela época o síndico já verbalizava de forma espalhafatosa seus planos de criação de um "polo cultural, um espaço permanente para shows e diversos eventos de moda e outras manifestações culturais para reforçar a fama internacional da Galeria do Rock e sua vocação para ponto turístico da cidade".

Este é o ponto crucial da questão: as mesmas coisas que Souza diz que faz e que quer fazer no famoso centro comercial paulistano, conhecido em toda a cidade e Estado de São Paulo simplesmente como "A Galeria", ele alardeava que iria fazer seis anos atrás. E, como é possível constatar, nada fez. Portanto, é extremamente irritante ler novamente as bravatas do síndico a respeito de seus "planos", os mesmos prometidos seis anos atrás e jamais implementados.

Saudosismos deixados de lado, a galeria deixou de ser um lugar agradável para se visitar por quem gosta de música. Talvez a mudança fosse inevitável, observado-se hoje o rolo compressor que amassou o mercado musical e fonográfico, mas ér inegável que o síndico contribuiu decisivamente para a mudança dos perfis comercial e de público. Os resultados, do ponto de vista cultural e comercial na área da música, estão longe de serem satisfatórios.

Entretanto, o Combate Rock nunca deixou de reconhecer os méritos dos mais de 20 anos de administração de Souza na Galeria do Rock. Comerciante essencialmente do ramo de vestuário, ele assumiu a administração de um local bastante famoso e venerado por quem gostava de música, mas devastado e decadente do ponto de vista da infraestrutura e serviços prestados.

Com uma visão empreendedora até então inexistente no centro comercial decrépito e caindo aos pedaços em vários pontos, Antonio de Souza Neto finalmente consertou as escadas rolantes e procedeu uma limpeza generalizada em todos os andares. A segurança interna do local foi reforçada e novos tipos de comércio foram atraídos, melhorando bastante a convivência e os acessos. Com isso, as constantes interdições por conta de inspeções das autoridades diminuíram drasticamente.

Do ponto de vista da música e da cultura, no entanto, o avanço acelerado em busca da mudança de perfil e de "agregar novos serviços" só serviu para descaracterizar a Galeria do Rock e afastar os apreciadores de música. A galeria perdeu em todos os sentidos, na opinião do Combate Rock, mas, aparentemente, o curso parecia ser inevitável, até porque a grande maioria dos condôminos aprovou as mudanças, seja em assembleias específicas ou nas constantes reeleições de Souza. A galeria chegou a ser personagem de novela da TV Globo, uma exposição inimaginável para o local, mas isso não foi aproveitado em termos institucionais – pelo contrário.

O assunto foi abordado em todos os seus aspectos pelo Combate Rock, inclusive com grande destaque aos mirabolantes planos do síndico. Entretanto, é desolador que o artífice e incentivador da mudança do perfil da Galeria do Rock reapareça em 2015 esbravejando e alardeando a mesma "plataforma" de anos trás para se defender de críticas e mostrar "serviço".

O Combate Rock não esqueceu o conteúdo despejado nas páginas da Veja São Paulo é o mesmo propagandeado há no mínimo seis anos. Pelo tanto que prometeu, sua atuação, ao menos no quesito cultural-institucional, é para lá de decepcionante,

LEIA ABAIXO ALGUNS TEXTOS A RESPEITO DAS MUDANÇAS DA GALERIA DO ROCK, DAS DISPUTAS INTERNAS E DOS PLANOS DA ADMINISTRAÇÃO DO LOCAL:

'Racha' na Galeria do Rock: lojistas de música questionam atividades culturais

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Galeria do Rock, novo ponto turístico de São Paulo

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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