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Gov't Mule comemora 20 anos com álbuns ao vivo - e homenageando Pink Floyd

Combate Rock

19/12/2014 06h51

Marcelo Moreira

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Não existe banda que mais presenteia seus fãs atualmente do que o quarteto norte-americano Gov't Mule. Obcecados por música e prolíficos até a medula óssea, gravam bastante e sempre que podem estão no palco. Não bastasse isso, adoram inventar moda: o último álbum, "Shout!", de 2013, foi lançado em duas versões: a normal, com as 13 músicas, e uma edição dupla, com as mesmas músicas, só que cantadas por artistas diferentes, a maioria de amigos, como Glenn Hughes (ex-baixista e cantor do Deep Purple e Black Sabbath), por exemplo.

Para comemorar os 20 anos de carreira e do primeiro lançamento, o maravilhoso CD "Gov't Mule", a banda decidiu simplesmente colocar quatro álbuns diferentes nas lojas a partir deste mês. "The Stoned Side of the Mule Vol. 1" traz sete clássicos dos Rolling Stones gravados em uma apresentação em 2008. Em princípio, só foi lançado em vinil, mas existem negociações para que saia em CD no ano que vem

É praxe no Gov't decidir em cima da hora tocar um álbum inteiro de uma banda preferida ou várias músicas de um artista, como recentemente ocorreu nos shows de Halloween pelos Estados Unidos – um set inteiro por cinco dias seguidos com quase 20 músicas de Neil Young, por exemplo.

O EP iniro é excelente, mas os destaques sã para a sombria versão para "Under My Thumb", o blues pesado de "Ventilator Blues" e pegada forte e suingada característica do Gov't Mule em "Paint It Black".

"The Dark Side of the Mule", como o nome entrega, é o registro de uma apresentação de 2010 da banda onde vários clássicos do Pink Floyd foram executados, boa parte deles do disco "The Dark Side of the Moon". O álbum foi lançado agora em dezembro em três versões: CD duplo, CD triplo e CD triplo com DVD.

Prepare-se para ouvir versões um pouco mais pesadas para "Time", "Comfortably Numb" (o solo de guitarra de Warren Haynes é primoroso), "Breathe", "Shine on You Crazy Diamond" e a maravilhosa "Fearless". Há também alguns clássicos do Mule, como a excelente "Blind Man in the Dark", "Gameface" e "Bad Little Doggie".

Para janeiro e fevereiro, estão previstos mais lançamentos de shows antigos. "Dub Side of the Mule" trará o quarteto tocando reggae com convidados especiais, a maioria jamaicanos – é praxe do Mule visitar a jamaica no começo de cada ano e fazer jam sessions com músicos locais. O último álbum levará a assinatura de "Sco-Mule", a uniã da banda com o guitarrista norte-americano John Scofield, amigo de longa data e que transita do jazz ao rock.

Formação atual da banda: da esq. para a dir., Danny Louis (teclados), Matt Abts (bateria), Warren Haynes (guitarra e vocais) e Jorgen Carlsson (baixo) (FOTO; DIVULGAÇÃO)

Formação atual da banda: da esq. para a dir., Danny Louis (teclados), Matt Abts (bateria), Warren Haynes (guitarra e vocais) e Jorgen Carlsson (baixo) (FOTO; DIVULGAÇÃO)

O surgimento do hard blues

O Gov't Mule praticamente inventou o subgênero. Surgiu da união de um guitarrista fantástico e experiente, um baixista grande e de mão pesada e um baterista insano, mas preciso como um relógio. E o trio surpreendeu com uma excitante mistura de blues e rock, algo tão importante quanto o surgimento de Stevie Ray Vaughan nos anos 80.

O grupo chega aos 20 anos de carreira cada vez mais forte, mais versátil e mais interessante. Nasceu de dentro dos míticos Allman Brothers, veteraníssima banda de southern rock norte-americana. Amicíssimo do líder, o vocalista e tecladista Gregg Allman, Warren Haynes, rodado músico sulista, aceitou tocar na banda no final dos anos 80, mas começou a ficar incomodado coma a falta de espaço para suas composições e para cantar.

Excelente guitarrista base e com um feeling blueseiro assustador, começou a gestar uma carreira solo ainda em 1990, com a bênção do amigo. Sua Warren Haynes Band, no entanto, só conseguiu lançar um álbum em 1992, com "Tales Of Ordinary Madness", sem grande repercussão com a sua mistura de rock, conuntry, folk e blues.

Irritado com a recepção fria de seu álbum e cada vez mais frustrado com os Allman Brothers, decidiu radicalizar: queria extravasar todas as suas influências em um som diferente, característico e pesado, calcado no blues. Chamou o companheiro de Allman Brothers Allen Woody, exímio baixista, e um conhecido distante, mas muito bem recomendando, o baterista maluquete Matt Abts.

Os primeiros ensaios do trio em 1993 deram tão certo que tudo foi acelerado: os primeiros shows, as primeiras gravações e as primeiras turnês, além da inevitável saída dos músicos dos Allman Brothers, mas sem ressentimentos – Warren Haynes voltaria a ser um dos guitarristas fixos do grupo em meados dos anos 2000, ao lado do pupilo Derek Trucks, sobrinho do percussionista Butch Trucks. Derek sempre manteve uma carreira solo desde que tinha 17 anos de idade. 

Mesmo com o projeto crescendo rápido, a banda mesmo só percebeu o potencial do que estava acontecendo em 1994, quando finalmente foi batizada de Gov't Mule, uma abreviação de Government Mule, alusão ao decreto do governo norte-americano do século XIX que oferecia ajuda a todo americano que quisesse colonizar o oeste do país –  com verbas para comprar uma mula e um pedaço de terra.

A velocidade com que as coisas aconteciam, entretanto, não foi suficiente para lançar um CD antes de 1995. Mas foi a melhor coisa que  ocorreu ao trio. "Gov't Mule", lançado em meados daquele ano, foi uma pedrada e considerado entre os dez melhores do ano de quase todas as revistas de rock e blues dos Estados Unidos.

O álbum definiu o hard blues, com músicas muito pesadas, com baixo com timbre grosso e "gordo" e bateria forte e marcante. Frequentemente o trio esbarrava no hard rock setentista, com muito peso e melodia, como na faixa "Mr. Big", original da banda inglesa Free. Ou então na pesadíssima "World of Difference".

O blues tradicional apareceu com "Mother Earth" e seu peso absurdo, com uma levada de guitarra típica de Jimmy Page (ex-Led Zeppelin). O jazz aparece nas suingadas "Mule" e "Rocking Horse".

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Sucesso imediato

Com sucesso crescente, viraram referência para uma série de artistas norte-americanos e seus shows se tornaram imensas jam sessions, com a presença constante de estrelas do rock. De tão gente boa que são considerados, ninguém consegue recusar um convite para gravar.

Basta ver a constelação de baixistas convidados para tocar nos projetos "Deep End I" e "Deep End II", lançados após a morte de Woody. Os dois álbuns, cada um duplo, contam com um baixista diferente em cada faixa. tocara, entre outros, Chris Squire (Yes), Jack Bruce (ex-Cream), John Entwistle (Who), Jason Newsted (então no Metallica), Roger Glover (Deep Purple), entre muitos outros, além do guitarrista James Hetfield na música "Drivin' Rain".

O substituto definitivo de Woody foi Andy Hess, conhecido músico de estúdio, mas também com passagens importantes na estrada com bandas de rock e jazz. Junto com ele veio Danny Louis, tecladista com larga experiência no meio musical do leste americano. Hess seria substituído seis anos depois por Jorgen Carlsson.

Como quarteto, o Gov't Mule ganhou em técnica e expandiu os horizontes, apostando mais no jazz, no rhythm and blues e até mesmo no reggae. Tais influências ficaram patentes nos CDs "Déja Voodoo" (2004) e "HIgh and Mighty" (2006).

Os fãs em geral começaram a chiar com os experimentalismos – que cultminaram no álbum de remixes e músicas inéditas com tratamento reggae "Mighty High" (2007) e o grupo resolveu voltar às origens. Andy Hess, considerado muito técnico e jazzístico, deixa a banda para a chegada de Jorgen Carlsson, que tem o boues como uma das principais influências.

Prolífico em registrar shows, é possível comprar no site da banda milhares deles, em qualquer lugar do mundo. Existem também os álbuns ao vivo, um melhor do que o outro. "Live at the Roseland Ballroom" é de 1996, e "Live With a Little Help From Our Friends" é um CD duplo sensacional lançado em 1998 – na versão de luxo, é um CD quádruplo.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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