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Os gigantes começam a sair de cena para descansar

Combate Rock

01/10/2014 06h35

Marcelo Moreira

A conversa já é antiga, saudosista, mas revela uma preocupação grande de quem preza pelo bom gosto e pela memória: o que virá depois que nossos heróis se forem? Quem terá condições de ocupar o vácuo? Quem vai sobrar para se tornar digno de merecer a eternidade, como os maravilhosos "dinossauros" dos anos 60 e 70?

Muitos não percebem, mas a mudança já está em curso e afetando diretamente os gigantes do rock. Ozzy Osbourne declarou nesta semana, ao site Blabbermouth.net, que o Black Sabbath vai gravar e lançar novo CD de inéditas em 2015, com uma eventual turnê, e deixou no ar que devem ser as últimas atividades do grupo, em razão da idade e também problemas de saúde do guitarrista Tony Iommi, que trata um câncer linfático. "Estamos perto dos 70 anos, não temos mais a energia dos 21. Tudo precisa ser planejado de forma meticulosa. Não dá para prever como será depois do novo CD, corremos contra o tempo."

Embora nem um pouco surpreendente, a declaração de Ozzy preocupou fãs em diversos fóruns de discussões pelo mundo. O tom era melancólico, com a pergunta de sempre: o que virá depois? Terá alguém capacidade para conseguir ocupar a vaga eternos heróis neste século XXI? É bom lembrar que outros gigantes, como Van Halen, Iron Maiden e Metallica lentamente vão desacelerando, espaçando cada vez mais suas atividades, em um movimento que projeta a busca por outros caminhos, que podem ou não incluir a aposentadoria – Van Halen e Iron Maiden caminham para completar 40 anos de carreira e o Metallica, 35.

Black Sabbath chega para a premiação do Grammy 2014 (foto: DIVULGAÇÃO/GRAMMY OFFICIAL SITE)

Black Sabbath chega para a premiação do Grammy 2014 (foto: DIVULGAÇÃO/GRAMMY OFFICIAL SITE)

Está demorando, mas os apreciadores de rock estão dando conta de que os gigantes estão definitivamente indo embora. Assim como o Black Sabbath ao menos cogita uma aposentadoria para 2015, outros astros projetam o mesmo. primeiro foi Eric Clapton, ao declarar no ano passado que não fará mais apresentações e turnês a partir de 2015, quando completa 70 anos. Roger Daltrey e Pete Townshend,  anunciaram que a turnê que começa em novembro, que será mundial para comemorar os 50 anos de atividade, será a última, com a possibilidade de um álbum novo sair no final do ano que vem. Daltrey terá 71 anos e Townshend, 70.

O bisavô Mick Jagger também reavalia as atividades dos Rolling Stones a partir de 2015, quando terá fim mais uma turnê – a última perna das comemorações dos 50 anos do grupo, e que passará por São Paulo, com show no novo estádio do Palmeiras. Aos 71 anos, disse recentemente que os planos para banda vão até o final do ano que vem e recusou-se a fazer qualquer tipo de ilação sobre o futuro – a imprensa inglesa especula que o baterista Charlie Watts, 73 anos, já teria comunicado aos amigos de banda que deixará os palcos após o final da excursão atual.

E o choque de realidade vem com mais força com a divulgação ontem de que Malcolm Young, o sustentáculo do AC/DC, realmente tem problemas graves de saúde. A banda australiana surpreendeu o mundo meses atrás ao anunciar que começaria as gravações do novo álbum, mas sem Malcolm, afastado por problemas de saúde. Todo mundo temia pela continuidade da banda sem o seu líder e mentor, e os remanescentes comunicaram pouco depois que a saída do guitarrista era definitiva, sem esclarecer os motivos do afastamento, e anunciando o sobrinho Stevie Young como substituto.

Roger Daltrey (esq.) e Pete Townshend, a dupla do Who, em foto promocional de 2013 (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Roger Daltrey (esq.) e Pete Townshend, a dupla do Who, em foto promocional de 2013 (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Após meses de especulações, que iam de Mal de Alzheimer a derrame cerebral, ontem finalmente a família Young se pronunciou a respeito dos problemas de saúde. Em um comunicado divulgado pela revista People, foi revelado que o músico sofre de um tipo de demência."Malcolm está bem e nós agradecemos por respeitarem a privacidade dele", diz o breve comunicado. A demência é a perda da função cerebral que ocorre com determinadas doenças como mal de Parkinson, esclerose múltipla, doença de Huntington, doença de Pick e Alzheimer. Ela afeta a memória, o raciocínio, a linguagem, o juízo e o comportamento, segundo dois médicos ouvidos pelo Combate Rock.

Ranzinza, irascível e estoico, Malcolm também era conhecido por ser uma locomotiva humana em relação ao trabalho, incansável na batalha para empurrar à frente o colosso AC/DC. Quando uma fortaleza como Malcolm Young desaba e precisa sair de cena, é sinal de que a realidade chegou com força, abalroando os gigantes do classic rock e colocando em xeque a indestrutibilidade e a eternidade.

Se B.B. King nos palcos aos 89 anos é um alento para quem venera as lendas, a doença de Malcolm Young e a recente morte do frágil Johnny Winter, aos 70 anos, nos devolvem à realidade: os maiores nomes da história do rock, aqueles que deram forma e transformaram o rock em um dos pilares do entretenimento moderno, estão saindo de cena.

"O Led Zeppelin não volta mais, não há mais tempo para isso. É hora de procurar outras coisas", disse ontem o guitarrista Jimmy Page, finalmente conformado com o fato de que sua banda está finalmente sepultada com mais uma recusa do vocalista Robert Plant de ressuscitá-la – o cantor, por sinal, está com novo álbum nas lojas, "Lullaby… And The Ceaseless Roar", na mesma linha dos últimos anos, um country rock sofisticado. Page afirmou que pretende resgatar a sua carreira solo, interrompida nos anos 90, para fazer poucas apresentações onde revisitaria toda a sua carreira.

O sepultamento definitivo do Led Zeppelin, nesta semana, é emblemático. Pode-se dizer que as declarações de Page e Ozzy, junto com os anúncios de Daltrey, Townshend e Clapton, encerram, muito provavelmente de forma definitiva, uma era em que os gigantes pisaram na terra, e por muito tempo. Finalmente os gigantes do rock decidiram descansar.

 

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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