Presidente metaleiro assumirá o poder na Indonésia
Marcelo Moreira
Joko Widodo é um funcionário público de Jacarta que acaba de ser eleito presidente da Indonésia, um dos três maiores países muçulmanos do mundo, em termos de população. Com idade em torno dos 40 anos, é fã de rock, e adora heavy metal. Chamou a atenção do mundo musical o fato de que "finalmente um chefe de Estado é declaradamente fã de rock pesado, fã de heavy metal", como escreveram diversos sites pelo mundo, inclusive no Brasil.
Widodo, fã de Metallica, Napalm Death e Lamb of God, entre outros, não é o primeiro chefe de Estado (presidente ou monarca) ou de governo (primeiro-ministro) a gostar de rock ou gostar de rock pesado. Edward Heath, primeiro-ministro da Inglaterra entre 1970 e 1974 pelo Partido Conservador, era fã declarado do Slade, grupo de hard rock daquele período. Tony Blair, que ocupou o mesmo cargo entre 1996 e 2006, foi guitarrista de algumas bandas amadoras nos anos 60 e 70 e gostava muito de Led Zeppelin e Deep Purple.
O que chama a atenção na eleição de Widodo é que ele assumirá o cargo em uma democracia recente, em um país de maioria muçulmana e que muitas vezes no século XX foi dominado por ditaduras militares brutais de inspiração religiosa. Não faz muito tempo que o rock era proibido no país. Com alguma liberalização, as amarras foram sendo afrouxadas a partir do final da década de 1980, com o início de uma incipiente cultura pop e indústria fonográfica, após vários anos de ditaduras civil e militar.
Ainda assim, poucas bandas se aventuraram a tocar em Jacarta, a capital do país. Os notórios desbravadores Deep Purple e Uriah Heep foram alguns dos primeiros, junto com o Sepultura, na segunda metade da década de 90. Mesmo em com a permissão de tocar, muitas bandas desistiam diante da quantidade de exigências feitas pelas autoridades, fortemente influenciadas por parte expressiva dos radicais muçulmanos.
A livre circulação dos músicos na cidade era proibida, o repertório do show tinha de ser submetido à censura e aprovado pelas autoridades. Drogas, nem pensar, assim como álcool. Qualquer deslize neste último quesito era punido com detenção sumária, com poucas chances de deportação ou expulsão do país.
Qualquer mensagem de cunho social/político/econômico ou fora do contexto musical provocava a interrupção imediata do show, com prisão dos músicos para esclarecimentos e confisco dos equipamentos e instrumentos. Até mesmo o volume da música dentro do recinto ou estádio era controlado. Nada que espantasse os milhares e milhares de roqueiros que sempre tiveram de ficar enfurnados para fugir das patrulhas contra o gênero musical. O prolema era convencer as bandas a irem a Jacarta.
Felizmente o século XXI trouxe ares mais civilizados à Indonésia, que encontrou certa estabilidade política com a solidificação de uma democracia e o respeito aos direitos humanos, ainda que haja uma série de crises localizadas por conta de etnias rebeldes ou disputas religiosas entre muçulmanos, cristãos e minorias religiosas.
O ambiente ficou menos tenso, mais tolerante e liberal, o que tornou Jacarta de dez anos ara cá um local bastante interessante para shows de rock, que nunca foram comuns ou corriqueiros ates. Ainda existe uma demanda represada por rock e cultura pop ocidental na Indonésia. Somente assim seria possível a ascensão ao poder, democraticamente, de alguém tolerante e abertamente roqueiro.
Talvez Joko Widodo não seja o primeiro presidente metaleiro da história. Mas é certamente o mais corajoso e o mais expressivo, justamente por ser o chefe de Estado e um país onde não faz muito tempo o rock era proibido pelo governo e execrado pela maioria muçulmana, com perseguição sanguinária de roqueiros, vistos como dissidentes e tão temidos/odiados/caçados como dissidentes políticos. Que outros países com passado medieval (e presente retrógrado, infelizmente) sigam o exemplo de abertura e tolerância da Indonésia.
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